Como eu fui na psiquiatra no dia errado e terminei chapada de LSD numa reunião
Saí para renovar a receita dos medicamentos, transei e não gozei, voltei para casa chapada
Burnout, foda mal dada, drogas, loucuras, bolo de laranja e som
Você deve estar se perguntando como um dia comum na vida de uma mulher normal termina com ela chapada de LSD numa reunião de trabalho.
Carrie Bradshow não faria melhor. Isa Rae teria inveja do roteiro. De dar inveja até mesmo em Carlos Lombardi e nas heroínas das novelas das 19h nos anos 1990. Lena Dunhan teria chorado em posição fetal enquanto escrevia Girls. Tati Bernardi teria gritado, ao vivo, em algum dos podcasts que faz.
Mas sim, estou falando de só mais um dia comum na minha vida. E o que isso tem a ver com as conversas urgentes? Tudo! Afinal, as urgências me trouxeram até aqui. Ou até aquele momento em que eu olhei para a tela do computador e pensei: não é possível que isso esteja acontecendo. Mas estava. Era quarta-feira da semana passada e eu, frustrada, sem emoção na vida, depois de errar o dia da consulta com a psiquiatra - aqui já vemos que nem tudo vai bem e nem precisamos do narrador para dizer - e de um sexo muito ruim, eu estava completamente drogada (ler isso com a voz da Fernanda Torres no programa "Que história é essa, Porchat?) numa tarde de quarta-feira sem conseguir raciocinar qual a sequência de acontecimentos horríveis na minha vida me levaram até aquele momento.
Eu poderia dizer que é o luto - para quem está chegando agora, eu enfrento o luto da perda do meu analista que faleceu de forma repentina há pouco mais de um ano, no mesmo dia que minha melhor amiga da faculdade morreu, há muitos anos - que foi a pandemia, o governo genocida, a falta de perspectiva, a gordofobia do cotidiano, a exaustão do trabalho. Ou, que tal, tudo isso junto? Chamam de burnout e eu já disse, inclusive, pro meu editor, que quem não está enfrentando um esgotamento, está vivendo errado estes anos. Mas, entre o esgotamento e o desespero, muita coisa aconteceu para me fazer tomar ⅛ de LSD na manhã daquela quarta-feira que eu apenas acordei, tomei minhas 150 gramas de desvenlafaxina (não tentem isso em casa), me arrumei, troquei mensagens com um cara que eu não suporto, mas que transava bem - ou eu tento me convencer disso para justificar que é o sexo mediano o máximo que tenho alcançado na minha vida que eu juro ser interessante, mas é totalmente sem graça e mediana e fui para a psiquiatra.
Ao procurar um lugar para estacionar, recebi a mensagem dela dando conta de que eu estava um dia adiantada. Isso mesmo. A consulta era quinta. Eu fui na quarta-feira. Estava ali, pronta. Pra quê? Como pode um ser humano errar o dia da consulta com a psiquiatra? Se eu não tivesse outros compromissos, mas meu celular estava explodindo de mensagens de trabalho e eu só conseguia pensar em como um ser humano consegue errar a data de um compromisso médico assim.
Vale destacar que essa foi a segunda vez em menos de dois meses. Dia desses fui na data errada renovar a CNH também. E isso me jogou uma lembrança de quando, na infância, perdi a data de um passeio com a escola e fui humilhada publicamente. Minha amiga acha que é psicanalítico e que, por isso, eu fico ansiosa e me adianto. Eu só oro para não fazer isso com algum voo - sim, porque errei o hotel dia desses.
Exaustão. Será?
Recolhi a vergonha de ter ido no dia errado, confirmei para o dia seguinte - já com a ansiedade instalada e pensando em como casar isso com a minha agenda de compromissos de filha exemplar, que leva os pais idosos para receber no banco, ao médico, para almoçar fora de casa e não sobrecarregá-los - e pensei: e se eu for transar?
E aqui, quem é que eu quero enganar? Eu quero sim ir transar. Aquela transa de meio do dia. Despretensiosa. Que a gente sai feliz e satisfeita por ter gozado horrores e ter deixado a semana mais gostosa. Sem amor, mesmo. Só com tesão. Eu queria muito isso. Queria fingir que tinha 20 anos de novo. Queria só encontrar o boy e transar.
Marquei com ele e fui. Claro que já beirando os 40 anos, é muita pretensão minha querer viver como os 20. Já não tenho mais a mesma memória, a mesma saúde mental e a sabedoria que deveria vir com a idade não chegou por aqui. Quem é que vai transar às 11h da manhã de uma quarta-feira?
Mas piora. Sempre piora. Eu achei, enquanto esperava o sinal de trânsito abrir, aquele ⅛ de LSD na bolsa. Fly Pig. Eu gosto do nome. Me evoca memórias boas e subversivas. E pensei: que tal incrementar a transa? E se eu ficar mais sensitiva? mais aberta? mais leve? E dá-lhe quadradinho de droga pra dentro do peito e muita água.
Cheguei na casa do boy e esqueci que tinha tomado o doce. Transei. Não foi bom. Já foi melhor. Não gozei. Falei pra ele que esperava mais. Ouvi - por educação e preciso levar isso também para a análise - as histórias tristes dele enquanto tudo que eu queria era gozar. Só gozar. Será que é pedir muito? Talvez seja, ando pensando sobre. Me vesti e fui embora. Lembrei que tinha que passar no supermercado. Quando estacionei no pátio e o sol bateu meio dia. Senti a primeira onda - avassaladora - da droga que eu tinha tomado e não tinha sentido. Não gozei, mas tava louca. Completamente chapada no supermercado. Tirei os óculos escuros e lembrei que sou míope. Não enxergava nada nas prateleiras e fiz uma compra absolutamente aleatória: energético de manga, carne, 10 pacotes de bolo de laranja (que compra essa quantidade?), creme de leite, chocolate e comida para os gatos. Gosto de pensar que, de algum jeito, tive responsabilidade com meus bichanos, mesmo chapada no supermercado.
Orei baixinho para não ser vista por qualquer pessoa conhecida, porque minha maior pira é dar pala quando estou chapada. Fico, obviamente, demonstrando o quanto estou louca e tentando, desesperadamente, evitar isso. Resolvi incluir uma água de coco na compra, já que era o que iria me salvar daquela onda. De longe, ouvia Karol Conká cantar nos alto falantes do supermercado e não conseguia sequer identificar que música era. Eu tava pisando fofo, com uma vontade absurda de rir de tudo e qualquer coisa, sobretudo da situação.
Fiz o que qualquer pessoa no meu lugar faria: peguei o celular e comecei a gravar áudios gargalhando para meus amigos. Dizendo como eu estava louca nos corredores do supermercado depois de uma transa super frustrante e pensando em como eu iria pra casa, dirigindo, naquele grau de loucura. E, pior: como eu faria uma reunião de trabalho que precisava fazer. Fato é que eu fui. Almocei. Tomei toda água disponível para mim e mais um pouco. Tentei curtir a onda e escrever um pouco. LSD é bom para escrita, penso. E para me deixar mais leve. O mundo anda cruel. Foi bom ter um pouco de felicidade artificial, apesar do julgamento de alguns amigos e da psiquiatra, no dia seguinte, quando consegui ir na consulta, renovar a desvenlafaxina e receber uma advertência de que as substâncias, combinadas, podem dar ruim para o corpo.
Voltei a comer salada, a fazer as reuniões sem tanta emoção e a mandar áudios menos interessantes para os meus amigos. O boy disse que precisava melhorar e deu uma sumida. Não sei se é depressão, a idade, ou falta de tesão. Da minha parte, penso que é o tal do esgotamento. Combinado ao burnout. Somando à vontade de ter uma transa boa, à frustração do desamor - mas isso é papo pra outra newsletter - e ao desejo imenso de me sentir bem, de alguma forma. De não me sentir pressionada e sufocada pelas demandas. De estar aqui, escrevendo e partilhando isso, como forma de me sentir mais viva e pertencente ao mundo.
De alguma forma, acho que consegui. Se não, trouxe entretenimento.
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LADRÕES DE URGÊNCIAS
Algumas coisas têm me tomado as urgências - e quase sempre elas são prazeres comuns, mas proibidos pelo capitalismo senão estiverem gerando conteúdo, então, aqui transformo em conteúdo para ter a “consciência tranquila” enquanto consumo:
Stand-up poetry: palavras para o futuro
Vanguardista. Assim eu defino o espetáculo "Stand-Up Poetry: palavras para o futuro" das artistas Luz Ribeiro e Mel Duarte, que esteve em cartaz no último final de semana no Sesc Belenzinho em São Paulo e se prepara para uma temporada em setembro e outubro também na capital paulista, como o festival Hipertexto.
Mas não é só. As palavras para o futuro são o agora. E, no palco, acontecem de forma rápida, urgente e sarcástica. Muito sarcástica.
Eu escrevi sobre na minha coluna no Estado de Minas. Você pode ler o texto completo aqui e já se programar para ir assistir a este espetáculo que revoluciona nossas certezas e desloca nossos sentimentos todos.
gasolina & fósforo
Se você comprou na pré-venda, a espera quase acabou. Estou, nesta semana, finalizando os envios pelos Correios e logo menos seu pacotinho cheio de poemas e amor chega. Caso não e queira comprar, só me mandar um e-mail no falajessicabalbino@gmail.com que agilizo a venda, que pode ser no PIX, transferência, cartão, como quiser!
Tô felizona de dividir meu livro com o mundo e de ouvir as repercussões. Inclusive, quero escrever sobre elas, mas farei isso aqui na newsletter tão logo conseguir.
📚📢 fora do hype
Goela Seca, de Jô Freitas
Fiquei absolutamente feliz e surpresa quando peguei o livro da Jô Freitas e vi que, diferente do que eu estava acostumada à produção dela, não se tratavam de poemas, mas de contos. A obra é deliciosa e, ao final, pode ser lida na forma de prosa, de poesia, de crônica. Trata-se de mais pura observação do cotidiano, especialmente da infância, do mergulho no que é sertanejo, no que é tenro, no que é mais sagrado: a família, as memórias de outros tempos, o chão vermelho das casas, as árvores, os calangos, o sol, o calor. A goela seca. As galinhas que teimam em viver. A fome que teima em assolar. As bonecas de milho. A felicidade que é simples. A dor que é crua. As memórias que tentamos fugir estão ali, expostas.
Curioso que li o livro numa crise de faringite intensa. Com a goela seca. Muita pastilha, própolis, xarope, água e a tentativa de molhar as palavras. O luto fica marcado pelo que arranha a goela. Pelas palavras que teimam em ser ditas a quem já não pode ouví-las. Pelo afeto que teima em transbordar, feito barro em dia de chuva na terra vermelha, molhada.
Penso em muito do que eu gostaria de escrever. Penso em todas as pessoas que me contaram histórias e fazem parte das minhas, mas que não sabem ler. Penso que, assim como Jô, desejo reler essas lembranças divididas entre os lances da escadaria da igreja, a Baobá e o desejo da juventude, especialmente o de que a morte não chegue tão cedo pra gente. Pra gente como a gente.
O livro de Jô é uma fez surpresa. É o percurso de uma autora que eu estou sempre encontrando em cursos, em formações, em espaços de troca e partilha. É o livro de uma mulher que está buscando o seu lugar e abre caminho para tantas outras a partir da palavra.
É um livro de travessia. E toda travessia pede olhares atentos, memórias registradas, jeitos de manejar e visitar a saudade do que ficou no passado.
O livro tem voz própria e, caso a gente enrede, pode ser um romance. Caso não, são contos de uma prosa poética aguçada, típica de quem está habituada à oralidade dos saraus, dos slams, de tantos projetos outros que tratam do registro oral como simbólico e urgente.
Queria que o livro estivesse no hype e, por isso, falo sobre ele. Desejo que todas as pessoas possam se revistar, como eu o fiz, ao conhecer as histórias de Joana, Perla e dos demais personagens que compõem a fotografia clicada por Jô.
Para conhecer mais da Jô Freitas, clica aqui!
🎧 nos falantes
Para quem chegou até aqui, minha dica de som é a Bebel Frota, que conheci este ano em Teresina (PI), fazendo um show de brega, mas que depois descobri que canta RAP também e estou um tanto obcecada.
Sempre ficou feliz por entrar em contato com o rap que é feito fora do eixo RJ-SP, sobretudo por mulheres e conhecer a Bebel, que é uma mulher gorda, nordestina e mega talentosa foi um baita presente!
Aperta o play e vem comigo!
💸 Se eu fosse esperta, venderia!
Aquela dica gratuita, mas que se eu fosse esperta, venderia!
A Clara Averbuck desbloqueia a criatividade e traz sua capacidade de criar em até três dias. Sério. Meu livro saiu do papel graças a uma oficina de escrita livre que fiz com ela. De forma totalmente deliciosa, ela consegue oferecer inputs de escrita, olhares e momentos para isso com absoluta generosidade, compartilhando muito do que já escreveu - são 9 livros premiados, etcetera - e fazendo com que a gente escreva e, por vezes, ache genial também.
Recomendo demais o curso.
Quer escrever e não está rolando? Escrevia um monte e agora travou? Sempre quis escrever mas não tentava? Vai ser dias 7, 14, 21 e 28 de agosto, das 19h30 às 21h30.
Infos: cepontinho@gmail.com
Por hoje é só! Essas são minhas urgências da semana e eu espero que vocês tenham curtido! Por aqui, vou testando os melhores dias para enviar, para ler, etc.
Vai me contando também!
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Gente que loucura hahahaha
Ja aguardando as proximas news!